[Com vocês] Ícaro Gonçalves: Aventuras de um grupo de pesquisa e pesquisadores

Desculpe essa Balbúrdia interrompida, mas a balbúrdia universitária tem carregado a gente. 

Nos últimos tempos, a equipe tem se esmerado em publicações acadêmicas: Lielson Zeni assina, com Mariana Gonçalves e Gabriel Cavalcanti, esse artigo pela Nona Arte, publicamos esse artigo sobre Oulipo, esse outro sobre a Bechdel, além de outros trabalhos no prelo e em andamento. 

A gente está, aliás, com uma chamada em aberto para contribuições sobre as pesquisas nos quadrinhos, até janeiro de 2026. 

Mas o que queria contar é que, além de escrever bastante (infelizmente pouco texto pra cá), a gente às vezes viaja. Nesta semana, participo de colóquio e abertura de exposição sobre a relação França e Brasil pelas imagens, sobretudo das imagens de viajantes. E vai ter mesa redonda com Marcelo d’Salete, Luli Penna e André Toral na sexta, na USP. 

Para contar de outras viagens, mais recentes, e mais… comportadas, talvez (?), convidei meu orientando para contar.

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Com vocês: Ícaro Gonçalves, doutorando em literatura da Universidade Federal de Santa Maria, e as aventuras de pesquisadores por terra brasilis. 

Como o clichê acadêmico que sou, estava contorcido na minha cadeira de escritório desconfortável me preparando para o primeiro semestre do doutorado, quando recebi a mensagem de que a chamada para as 9as Jornadas Internacionais em Quadrinhos, um evento de pesquisa de quadrinhos na USP, estava aberta. Pouco depois, saiu a chamada para o Linhas Paralelas, um congresso de grupos de pesquisa de quadrinhos na UTFPR.

Ficar organizando a pilha precária de livros que ainda tenho que ler infelizmente não ajuda no meu doutorado, nem dá para colocar no Lattes, então me inscrevi nos eventos. Durante o mestrado, havia participado apenas de congressos em outras cidades pela modalidade online, mas essa não era uma possibilidade este ano. Assim, no segundo semestre de 2025, tal qual uma tartaruga indo em direção ao mar, coloquei minha mochila nas costas e me preparei para as viagens.

(Sim, as viagens, no plural. Faz mais de dois meses e eu sinto que ainda estou me recuperando)

9as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos

As 9as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos foram organizadas pelo Observatório de HQ da Escola de Comunicações e Artes da USP São Paulo. O evento reuniu pessoas de todos os lugares para falarem sobre suas pesquisas e descobrirem o que mais está sendo estudado na área, além de contar com Benoît Peeters, Kelly Cezar e Juan Acevedo como convidados. As apresentações foram divididas em sessões temáticas e organizadas de forma com que os trabalhos se conectassem (mesmo que essa conexão fosse um pouco tênue às vezes). A pluralidade das comunicações permitiu muitas trocas entre os pesquisadores, reforçando as diversas possibilidades de estudos na área dos quadrinhos. 

Os membros do GPOQT participaram de várias sessões temáticas, tanto apresentando comunicações quanto mediando as discussões. Inclusive, a pesquisadora Luísa Loureiro Monteiro de Castro Teixeira realizou a tradução consecutiva na segunda conferência de Benoît Peeters! A lista das comunicações apresentadas está disponível no link: https://www.ufsm.br/cursos/graduacao/santa-maria/letras/2025/08/18/gpoqt-nas-9as-jornadas-internacionais-de-historias-em-quadrinhos

No meu caso, eu apresentei apenas uma comunicação na quinta-feira a tarde, Entre Imagem e Texto: Os Balões de Fala e Pensamento nos Quadrinhos, baseada na minha dissertação de mestrado. Cada experiência de apresentação é particular, e para mim, sempre são particularmente estressantes. Enquanto a maioria tem que correr para terminar dentro do tempo estipulado, eu posso contar com a minha ansiedade para garantir que eu fale tão rápido que termine com tempo de sobra. 

Quando chegou o momento das temidas perguntas do público, a maior parte das pessoas indagou sobre a apresentação de Maria Clara Carneiro e Mateus Araujo Braz, Funções do Requadro em Alguns Mangás: Dilatar o Tempo, Pontuar o Espaço, que foi, aparentemente, polêmica ao falar sobre elipsis. Admito que ainda não entendi o porquê de ter sido algo tão controverso, mas foi um grande alívio não ser o foco do esquadrão de fuzilamento de perguntas e poder apenas observar o momento de rinha de conceitos extremamente específicos.

Linhas Paralelas

Já a segunda edição do Linhas Paralelas ocorreu na UTFPR em Curitiba. Este evento reúne grupos de pesquisa de quadrinhos no Brasil, organizados pelos grupos coordenados pela professora Marilda Queluz na UTFPR e pela professora Maria Clara Carneiro na UFSM. Ele é mais voltado para os seus participantes. Assim, é estabelecida uma comunicação entre eles, o que possibilita a construção de uma rede para trocas e apoio. É interessante conseguir observar as dinâmicas dos diferentes grupos de pesquisa das universidades e como estabelecem conexões internas e externas. Além disso, é possível ver quais tipos de estudos costumam ser promovidos por eles, traçando um panorama diverso sobre as linhas teóricas e abordagens possíveis para pesquisar quadrinhos, o que traz muitos benefícios para essa área de estudo. 

A ideia do Linhas Paralelas desse ano foi de apresentar pesquisas em andamento. Assim, entre apresentações sobre dissertações recém-qualificadas e teses sendo desenvolvidas, também participei falando da minha pesquisa de doutorado sobre quadrinhos de terror, no momento pouco mais que um pequeno embrião em uma placa de Petri.

Apesar de ter dormido um total de quatro horas nos dois dias anteriores ao congresso, consegui sobreviver e ser razoavelmente coerente na comunicação. Inclusive, entrei em contato com pessoas que têm interesse nessa mesma área, como a Mhorgana Alessandra, editora de quadrinhos e pesquisadora sobre neurodivergência e quadrinhos (infelizmente, ela resolveu ser sensata e relevante e estudar um assunto com importância e impacto social. Trágico).

Bienal de Quadrinhos de Curitiba

Logo depois do Linhas Paralelas, entre os dias 04 e 07 de setembro, ocorreu a Bienal de Quadrinhos de Curitiba, com o tema “Futuros Possíveis”. A curadoria do evento foi feita por Maria Clara Carneiro, professora do Programa de Pós-Graduação em Letras (PPGL) e uma das organizadoras do GPOQT; Dandara Palankof, tradutora e editora; e Mitie Taketani, proprietária da Itiban Comic Shop, espaço referência em quadrinhos no Brasil.

A Bienal contou com várias atividades em diferentes espaços da cidade. Boa parte ficou concentrada no Museu Oscar Niemeyer (conhecido carinhosamente como MON), onde ocorreram as mesas de conversa sobre diversos temas envolvendo quadrinhos, atualidades e, seguindo o tema do evento, futuros possíveis. A feira Muvuca também foi realizada no MON, e ela com certeza fez jus ao nome. Com aproximadamente 200 artistas convidados, além das 30 mesas de conversa envolvendo os expositores, a circulação do público era constante.

Também foi realizada uma residência artística na Gibiteca de Curitiba. Sob a coordenação e curadoria de Weaver Lima e co-curadoria de Guilherme Caldas, foi um processo de 10 dias que envolveu artistas brasileiros e franceses, e os resultados da residência estão em uma exposição no local. Também foram ministradas oficinas sobre produção de quadrinhos no Estúdio Riachuelo e no Cine Passeio no decorrer do evento.

Além da Gibiteca, o MuMA (Museu Municipal de Arte de Curitiba) acolheu várias exposições de quadrinhos, dentre elas “Futuros Possíveis: Distopias e Utopias”, “A Arte de Ivo Milazzo”, “Ainda estamos aqui” e “Rir Até Que o Mundo Acabe”. Foi lá também que ocorreu a exposição da homenageada da Bienal, a roteirista Cida Godoy. 

Eu tive a grande sorte de poder participar da pesquisa para a exposição da Cida Godoy. Admito que não conhecia ela anteriormente, então pude aprender muito sobre essa figura incrível e descobrir mais sobre o passado dos quadrinhos brasileiros de terror. Também tive a oportunidade de fazer um trabalho de arqueologia digital para conseguir encontrar e resgatar alguns dos quadrinhos roteirizados por ela (quase um Indiana Jones de pijama, com postura ruim e sem espaço no google drive). Foi algo muito especial poder participar dessa exposição, descobrir mais sobre esses nomes tão importantes dos quadrinhos brasileiros e poder levar isso para mais pessoas.

De  volta para casa

Depois de todas as aventuras em São Paulo e Curitiba, chegou a hora de arrumar as malas e voltar para casa. Ainda mais porque, graças aos artistas incríveis nos estandes da Feira Muvuca, estava quase estourando o limite do meu cartão. 

Chegando aqui, recebi o desafio da minha orientadora de escrever sobre os eventos, focando nas minhas experiências. Admito que fazer esse texto não foi fácil, não tenho costume de escrever sobre mim, uso a primeira pessoa mais quando escrevo contos ficcionais e tenho dificuldade em imaginar que alguém se interessaria muito pelas minhas experiências. Mas de qualquer jeito, escrevi, reescrevi, empaquei, pedi ajuda, me estressei, até que, enfim, terminei o texto. Ou dei ele por terminado em algum momento.

Como já coloquei, essa foi a primeira vez que viajei para participar de eventos. Não posso falar pelas outras pessoas que estavam lá também, mas posso afirmar que, para mim, foram experiências únicas. Poder estar presente, conhecer e trocar ideias pessoalmente é algo essencial para desenvolver conexões e redes de pesquisa, expandir horizontes e aprender cada vez mais. 

Mas (in)felizmente, congressos não duram para sempre. Então, depois das aventuras, volto a fazer contorcionismo na minha cadeira de escritório desconfortável e para minha gata carente que gosta de sentar na frente do meu computador quando tento trabalhar. E agora organizo uma pilha ainda maior e mais precária de livros e gibis para ler. 

Publicado por mckamiquase

Maria Clara Ramos Carneiro on ResearchGate https://orcid.org/0000-0003-2332-1109

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