Se você ainda não conhece o trabalho do James Kochalka, recomendo que fique de olho na Mino, porque o maneiríssimo Fungos está prestes a ser publicado pela editora. Já que o autor é inédito no Brasil, quem sabe esta entrevista ajude a te mostrar que publicá-lo por aqui é uma ótima ideia. Dá um bizu.
Paulo: Na sua opinião, quem é o homem mais engraçado do mundo?
James Kochalka – Puxa, não faço a menor ideia. E se a pessoa mais engraçada não for um homem? E se for uma mulher, ou um rapaz ou uma garotinha? Talvez o homem mais engraçado do mundo nem seja humano! Talvez seja um cachorro bobão. Eu já conheci uns cachorros muito engraçados, sério.
Além de quadrinhos, você também tem uma banda. James Kochalka Superstar é ótima (e eu adoro Jazzin’ Hell também). Como funciona o seu processo criativo com dois projetos? Uma forma conflita com a outra? Talvez você esteja trabalhando num quadrinho e aparece uma ideia pra uma música… como funciona?
Ah, legal que você conheça a minha banda de faculdade, Jazzin’ Hell. Casio, saxophone, e voz… a gente era a frente do nosso tempo.
Enfim, eu não sinto nenhum conflito em relação às duas mídias. As duas têm a ver com explorar a sua imaginação e tentar criar algo a partir disso. Se e estiver desenhando um gibi, com certeza vou tentar escrever uma música sobre ele também. E por que não?
É curioso, porque eu vi uma entrevista com o diretor Michael Haneke (Funny Games, A Professora de Piano) na qual ele diz que é comum as pessoas notarem uma relação entre fazer um filme e escrever, mas para ele, os filmes tem uma relação maior com a música, por causa do ritmo. Um filme precisa de ritmo, é algo mais importante do que as pessoas normalmente percebem. Você escreve tanto gibis quanto músicas. Para você, qual a relação entre os dois processos?
Todos os processos artísticos estão relacionados. Desenhar um quadrinho é como escrever um romance, é como dirigir um filme, é como coreografar uma dança, escrever um poema, compor uma sinfonia, é como atores em uma peça.
Há alguns dias, na festa de lançamento de Boo Goes Like This!,em vez de fazer a clássica leitura do autor, eu convoquei pessoas da plateia. Dei uma cópia do livro aos voluntários e designei um personagem para cada um. Então atuamos como se estivéssemos numa peça.
Isso quer dizer que eu escrevi a peça? Ainda é um quadrinho, mas claramente há similaridades que o fazem funcionar de outras formas.
Já teve preferência entre quadrinhos ou música em alguma época? Já chegou a pensar que talvez tivesse que escolher entre um deles, quando estava começando sua carreira?
Não tenho preferência. Desenhei gibis e escrevi músicas a minha vida inteira. O mundo meio que escolheu os quadrinhos pra mim, porque eu ganho mais dinheiro, com mais consistência, do que com música.
Já chegou a pensar que seria publicado no Brasil? Qual acha que será o impacto do seu trabalho num cenário tão diferente do dos EUA?
Não, realmente não esperava. Nem havia passado pela minha cabeça. A Janaína de Luna veio falar comigo. Nem sei como sabiam do livro, porque acho que Fungos é um dos meus trabalhos menos conhecidos aqui nos EUA.
Mas eu já fui publicado em português antes, só que não no Brasil. Visitei Portugal várias vezes há dez anos, conheci muita gente dos quadrinhos por lá.
Quanto ao que alguém que não é dos EUA pensaria sobre o meu trabalho, não faço ideia. É claro que ter nascido e crescido aqui tem um impacto enorme na minha alma e na minha mente, mesmo que eu seja muito diferente das outras pessoas.
Você conhece o trabalho de algum artista brasileiro?
Não, de nenhum! Conheço o trabalho de alguns cartunistas argentinos… Pablo Holmberg e Liniers, por exemplo… mas infelizmente não conheço os autores do Brasil. Espero que a Janaína me mande algum material pra mudar isso.
Este é um ano eleitoral, e está muito esquisito. Você encontra inspiração nestas situações políticas surreais?
Na verdade, tem sido muito estressante. Estou ansioso pra ser velho o suficiente e não me importar mais com política.
Mas eu observo as pessoas e aprendo o que posso a partir disso e o que vejo pode acabar em algum personagem de um livro, com certeza. O personagem Kack Krak, do SuperF*ckers é levemente baseado no George W. Bush, por exemplo.
Quais as suas esperanças para estas eleições?
Com certeza, nada de Trump. Ouço muitas pessoas dizerem que se mudarão para o Canadá se ele vencer. Mas eu prefiro ficar e lutar. (Não fisicamente, digo, me opor a ele politicamente).
Ele é muito perigoso, mesmo que não vença.
Você também já trabalhou com jogos de videogame. Glorkian Warrior: Trials of Glork é muito animal. Podemos esperar mais jogos seus?
Eu adoraria, mas preciso de colaboradores. A PixelJam está ocupada com os seus próprios jogos no momento, e eu não consigo fazer sozinho porque não entendo de programação.
Eu costumava programar os meus jogos em BASIC quando era adolescente, mas isso faz muito tempo. Tenho várias ideias pra jogos. O difícil é encontrar colaboradores confiáveis. Não posso investir muito tempo em qualquer um, aprendi isso por experiência própria, infelizmente. Mas foi ótimo trabalhar com a PixelJam, eu amo aqueles caras.
Tem algum jogo que chamou a sua atenção nos últimos anos?
Os jogos da Amanita Design têm sido ótimos. A série The Samorost e Botanicula. Eu ainda não joguei Saromost 3, que acabou de sair.
Acabei de perceber, escrevendo a resposta, como as criaturas de Botanicula são como os meus Fungos. Não é à toa que eu curto!
A estética e o humor de Fungos se aproximam muito de um tom infantil, ao mesmo tempo com observações profundas sobre comportamento social e política. A sua música também é assim. Tem uma entrevista que você diz que o álbum Soprad Your Evil Wings and Fly é, entre outras coisas, sobre 11 de setembro. Você acha que o seu trabalho perderia algo se você tentasse uma abordagem mais direta? Existe alguma coisa que te faz manter as coisas nessa pegada mais cartunesca?
Acho que deixar as coisas mais “bobas” me permite passar despercebido pelas defesas do leitor e chegar até eles de uma forma que uma abordagem mais direta não seria capaz.
Já pensou em fazer um gibi sobre Glorkian Warrior: Trials of Glork, criando uma ponte entre quadrinhos e videogames?
Caramba, na verdade eu tenho TRÊS graphic novels do Oh my gosh, Glorkian Warrior. E até uma mino-rock ópera, Good Morning, Glorkian Warrior.
Tá aqui:
https://kochalka.bandcamp.com/album/good-morning-glorkian-warrior
Tem alguma chance de a gente te ver aqui no Brasil?
Bom… tenho um irmão no Paraguai que eu nunca visito. E o Liniers já me convidou várias vezes pra visitá-lo na Argentina. Será que eu devia fazer uma tour pela América do Sul?
Pra encerrar, qual o significado de Balbúrdia pra você?
Alto e fora de controle.