Ugrito, da Ugra Press, é uma coleção de pequenos livros (pequenos mesmo, formato A6) com histórias curtinhas, cada um de um quadrinista diferente. A oitava edição ficou na mão da Fabiane Langona [a Chiquinha].
Se gentileza gera gentileza, a repetição industrial faz o quê? “Esvazia” é uma resposta e é disso que trata esse quadrinho da Fabiane.
A primeira coisa que me chamou em A mediocrização dos afetos foi a quantidade de texto. Porque a Chiquinha que eu lembrava das charges/cartuns/tiras era muito mais direta.

Nenhum problema aqui, sério (foi uma quebrinha no meu horizonte de expectativa, o que geralmente é bom). Na real, se eu acompanhasse direito o Chiqsland, isso não me surpreenderia.
Esse quadrinho tem um ritmo muito particular, porque o texto distribuído por todas as páginas faz parte do mesmo enunciado: uma longa reflexão sobre o esvaziamento da palavra “amor” pelo personagem Coração Mongão.
Ao banalizar uma palavra, banaliza-se também seu sentido, diminui a força não só das quatro letras de “amor”, mas do próprio amar (afinal, somos seres de linguagem). Se a gente ama tudo, nada se destaca, nada tem aquele valor especial.
Pior: tem tanta gente que diz AMOR pra dizer interesse, dizer uso, dizer vontade, mas quase nunca fala mesmo sobre amar.

Coração Mongão não age além de suas ponderações e lembranças, é uma espécie de solilóquio em quadrinhos. O discurso em texto tem um tom de humor sutil, enquanto os desenhos são mais diretos, com situações episódicas e exemplares pra esse texto, resolvendo a cena em poucos quadros (muitas vezes, em um quadro só – taí a Chiquinha chargista).
Quando o texto fica geral, o desenho particulariza e a linguagem dos quadrinhos emerge: a justaposição texto e imagem.
A organização das vozes enunciatórias de A mediocrização dos afetos passa também pelo letreiramento: as letras são caligráficas nos desenhos; já nos recordatórios do personagem são tipográficas.

Essa contraposição entre o contínuo e o alternado, um humor mais bruto e outo mais leve, uma história curta com um tempo de leitura longo (maior do que o esperado seria mais correto) me conduziram por um andamento narrativo bastante particular.
Tão particular quanto o amor, preferido pelo Coração Mongão. E por mim também.