Aproveitando um raio de sol da cozinha, tentando me isolar enquanto barulhos de trocentas obras em volta do edifício parecem desconhecer o mal invisível que nos domina e o mal em pessoa que nos governa, abri ao acaso essa Métal Hurlant da Chantal Montellier. Edição em espanhol, encontrada por acaso em um sebo, um ano atrás.
Não há indicações de tempo: mais uma história dos anos 1980 em Guerra Fria. Pessoas dentro de um shopping modernoso são obrigadas a se isolarem… do mundo lá fora: uma explosão atômica inesperada, mas o novíssimo centro comercial estava muito bem preparado para se tornar seu bunker. A administração, só visível pelas comunicações via TV e alto-falantes já tinha cuidado de tudo: havia tarefas para ocupar cada uma das pessoas, e aboliram a troca de produtos por dinheiro, tudo era separado de acordo com o indivíduo, pela administração. Porém, nossa heroína, apontada como bibliotecária, percebe que os agentes de segurança não devolviam certos livros…
O desenho de Chantal me lembrou muito o do Jacques Tardi nesse livro, a primeira página é extremamente o desenho dele.

Talvez ela tenha linhas ligeiramente mais retas, olhando agora bem grande na tela, enquanto Tardi usa mais curvas.

Dela, eu tinha lido antes Odile et les crocodiles, com um refinado uso da bicromia preto e verde e linhas mais finas.

Engraçado que, ao procurar imagens para a postagem, me deparei com esse site apontando justamente Shelter como um exemplo de autores influenciados por Jacques Tardi. Um ano mais velho que Chantal, as linhas contínuas e firmes do francês já eram sua assinatura, conhecida desde seus trabalhos na Pilote no começo dos anos 1970. Nessa época, ela desenhava sobretudo ilustrações para jornais de esquerda.
Chantal Montellier começou a desenhar seus quadrinhos no final da mesma década. Shelter, que recentemente ganhou uma nova edição ampliada e colorida, está entre suas primeiras publicações, e é parte da coleção de quadrinhos de ficção científica Métal Hurlant, mais conhecida no Brasil como Heavy Metal (Humanoïdes Associés). Ainda produzindo e participando de feiras, só teve um livro seu traduzido para o Brasil, O Processo.