Em vez de uma obra nessa resenha, vou falar logo de dois livros aqui: Trilium, de Jeff Lemire e Jose Villarubia (Panini, 2018, tradução de Érico Assis) e Os Nomes, de Peter Milligan, Leandro Fernandez e Cris Peter (Panini, 2018, tradução de Felipe Castilho).
Pensei em fazer as duas resenhas juntas pra não precisar falar muito de dois quadrinhos que não gostei e aí achincalhar em excesso os gibis (espero que funcione). É que esse negócio de falar mal, às vezes, parece meio pose, tentativa de meter panca de malzão, destruidor das certezas, semeador das verdades ocultas, mas nesse caso, juro pra vocês, eu apresento os meus porquês de não gostar (ainda que rapidinho). Vale lembrar, sempre, que apresentar as minhas razões não quer dizer que é você obrigado a concordar comigo. Vamos lá.
Trillium, do Lemire: olha, insisto em tentar gostar dele, mas não tem jeito, só acho massa mesmo a série Sweet Tooth (6 volumes pela Panini entre 2012 e 2014). Olhei pra esse encadernado e pensei “ficção científica nesse desenho estranhão do Lemire?”, vale arriscar.
É uma história que se passa em dois tempos: um explorador britânico de 1920 e uma exploradora em 3797 e aí o Lemire começa a paralelizar tudo: explorador, exploradora, homem, mulher, a própria salvação, a salvação do mundo inteiro etc. E , bem, quando a trama começa a fazer isso, fica esperto que lá vem uma história de amor romântica clássica.
No fim, todo a parafernália de viagem no tempo e vírus que causa o fim da humanidade é pra alicerçar uma pieguice cósmica romântica do naipe ERA SEU DESTINO FICAR JUNTOS e o AMOR VENCE TUDO. Talvez em outros tempos isso me irritasse menos, mas se há prova de que o amor não vence tudo é nossos dias: atiradores em massa, governantes autoritários, massacre de indígenas e segue o baile do demônio.
O amor é um elemento massa, te ajuda, pode até dar uma sobreforça, mas não VENCE TUDO. Infelizmente.
Quanto à arte do Lemire que todo mundo achincalha, gosto dessa coisa meio torta, disforme e sem jeito. Ela vai na contramão do desejo de um roteiro previsivelzinho com invenções narrativas que, fora o valor em si de tentar algo novo, meio que não valem nada. É virar página pra lá, pôr revista de ponta cabeça, para no fim, a história te levar pra um lugar-comum daqueles mais gastos.
Os Nomes: essa é até melhorzinha, e me lembra uma onda Occupy Wall Street quando todo mundo odiava os 1% e tal, mas tem um fator que acho o pé podre de qualquer roteiro: fingir alta complexidade pra não entregar nada além de uma trama de ação embalada em falsas boas ideias. Toda a teoria da superconspiração, do superalcance das organizações e seus meio infinitos de recursos financeiros e humanos, se levados em conta na história, fariam o quadrinho acabar ali na página 4 ou 5.
Também me incomoda a representação da protagonista supergostosona e que luta pau a pau com os maiores assassinos do mundo, afinal, ela é professora de acadêmia. Não tô aqui exigindo um grau de realidade enorme na história; é ela mesma que aponta pra isso e não entrega.
Essas duas histórias são aquelas que podem ser usadas de exemplo da “decadência” da Vertigo e que culminaria no seu encerramento. Discordo dessa visão, porque faz parecer que tudo que saía nos anos 1990 pelo selo era ótimo (e não era). Inclusive, o que era ruim naquele período era meio parecido com essas duas séries aqui: metida a esperta e cheia de desculpas, mas só entrega uma história de amor clichê e outra história de ação igual a todas as outras.