Em tempos bicudos, ou se resiste ou se entrega, é difícil ir além desse binômio – a tal terceira via, ser neutrão, é se entregar. Há, porém, mais de uma forma de resistir, que pode ser na arena da representação política, pode ser em organizações com trabalho mais direto na sociedade, pode ser na divulgação de ideias.
A Plaf, iniciativa dos editores pernambucanos Carol Almeida, Dandara Palankof e Paulo Floro, é uma revista com matérias da cena brasileira contemporânea, sem esquecer a produção que trouxe a história dos quadrinhos brasileiros até hoje. Há entrevistas com artistas de diversas gerações, resenhas de obras de diferentes períodos e uma generosa quantidade de páginas para histórias em quadrinhos, tudo isso sempre conduzido por uma aguda percepção do momento político e cultural brasileiro.
Gosto particularmente da segunda edição não só por causa dos bastidores de O Maestro, o Cuco e a Lenda com Wagner Willian e das entrevistas com Marcelo D’Salete, Jô Oliveira e Henrique Magalhães, mas principalmente pelo apanhado bastante analítico de Ramon Vitral da cena brasileira editorial voltada aos quadrinhos, o perigo da Amazon, a quantidade de lançamentos difícil de dar conta na leitura, os valores. Daqueles textos que a gente espera que haja um livro com todos os desdobramentos apontados ali. O ensaio de Carol Almeida sobre as cidades fictícias parece precisar de mais espaço e ter ficado curto (não sei se foi exigência editorial – ou seja, espaço – ou por eu gostar muito do tema e queria mais), a mesma coisa da página dupla de quadrinhos sobre música do Paulo Floro – rendia mais.
Quanto aos quadrinhos, a experimentação de Mascaro é o tipo de material que eu frequentemente procuro, a arte e narrativa de Jô Oliveira impressionam, a narrativa histórica de Roberta Cirne vem embalada por um traço realista de cores bastante bem executadas, o estilo do Felipe Portugal me agrada muito, embora essa não seja uma de suas histórias mais inspiradas e nem mesmo o desenho e colorização lindos de Brendda Costa Lima me fazem curtir autoajuda. Ou seja, bons quadrinhos para todo o tipo de leitor.
Em tempos obscurantistas, de desprezo pela informação, uma revista voltada aos quadrinhos como a Plaf, abertamente combativa e de preocupação com representação, é mais um ponto pra ligar os fios de esperança que cada um de nós temos para seguir em frente e sobreviver. Um dia olharemos para trás e vamos ver que a Plaf, além de estar do lado certo da história, ainda nos ajudou a passar por isso tudo.
Agradeço aos editores pela oferta da revista.